
Congonhas é uma das mais famosas cidades históricas de Minas Gerais. O Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, cercado por esculturas do mestre Aleijadinho, e reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, é um dos maiores símbolos do período colonial brasileiro. As obras foram construídas em várias etapas, entre 1757 e 1875. Mas, o conjunto arquitetônico pode estar correndo um grande risco por causa de uma gigantesca barragem de rejeitos de minérios.
Santuário do Bom Jesus de Matosinhos
A represa da Casa de Pedra começou a ser explorada em 1913. A data antecede em muito a fundação da Companhia Siderúrgica Nacional, que aconteceu em 1941, pelo ex-presidente Getúlio Vargas.
Só cinco anos depois que a CSN já existia é que a mina foi incorporada à estatal, junto com a represa. Naquela época, Casa de Pedra continuava sendo apenas um reservatório de água.
Na década de 80 começou a ser erguido no local, bem ao lado da represa, um conjunto popular que não para de crescer.
Há 15 anos Casa de Pedra entrou em operação. Hoje a barragem de rejeitos é a mais conhecida do quadrilátero ferrífero. A represa da Companhia Siderúrgica Nacional é também a maior do estado em capacidade de estoque de resíduos de mineração, com cerca de 50 milhões de metros cúbicos.
Considerada também a maior barragem construída em área urbana na América Latina, sua capacidade é de quase cinco vezes o volume que irrompeu em Brumadinho.
Com um tamanho assustador, e com a quantidade de reserva de resíduo, a barragem de Congonhas está classificada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) de Minas Gerais como de Classe 6. É a mais alta categoria de risco e de dano potencial associado em caso de rompimento.
Não é atoa que após a barragem de Córrego do Feijão ter se desmanchado, os 51 mil moradores de Congonhas não tem conseguido dormir direito.
Mas as duas têm características bem distintas. Enquanto Casa de Pedra foi construída com a técnica jusante, as de Mariana e Brumadinho, que estouraram, eram com o sistema a montante.
Mesmo assim, segurança é uma palavra fora do dicionário de quem vive em Congonhas. Para tirar ainda mais o sono dos moradores na cidade, há tempos a CSN vem pleiteando aumentar o alteamento da barragem em mais 11 metros. Ou seja, o paredão passaria a ter 87 metros de altura, algo parecido com um prédio de 29 andares. Há pelo menos 10 anos os moradores lutam para que esse projeto não siga adiante.
O processo está em análise na Secretaria de Estado de Meio Ambiente.
"É uma represa que dá medo. É um monstro que está em cima de Congonhas", diz o prefeito, conhecido como Zelinho.
"A empresa (CSN), diz que a construção é moderna e que não existe risco. Mas a barragem de Brumadinho também não tinha risco, de acordo com o laudo de setembro (que atestava a estabilidade da estrutura da Vale). Então, acho que não existe risco zero em represa nenhuma", considera o chefe do executivo local.
Se nem o prefeito está se sentindo confortável, imagina os moradores de Congonhas. Além da Casa de Pedra, no município existem pelo menos mais outras 20 barragens.
Na semana passada a população improvisou uma reunião pública para discutir a suspensão das atividades da barragem. O encontro foi na rua Carlota Cordeiro. Mais de 3 mil moradores compareceram à manifestação.
Antes da reunião, o prefeito Zelinho soltou uma nota afirmando que a prefeitura proibia qualquer alteamento em barragem, e que os diretores da empresa serão responsabilizados criminalmente em caso de rompimentos.
Os membros da associação apresentaram três propostas de ações que foram entregues a um funcionário da Companhia Siderúrgica Nacional, já que a empresa se recusou a receber uma comissão:
1 - Desocupação imediata dos bairros Residencial Gualter Monteiro e Cristo Rei, com remoção dos moradores para residências em áreas seguras da cidade, sob responsabilidade da CSN.
2 - Suspensão das operações na barragem e monitoramento constante de sua estrutura com pessoal qualificado, além de iluminação de toda sua área.
3 - Indenização às famílias por danos morais em decorrência da situação de ameaça constante vivida por todos desde a instalação da barragem no local e seus processos de alteamento.
Segundo Sandoval de Souza Pinto Filho, diretor de Meio Ambiente e Saúde da União das Associações Comunitárias de Congonhas, faltam canais de comunicação com os responsáveis pela barragem. "A empresa não tem a menor abertura para diálogo com a comunidade e nem com a imprensa", explicou o diretor da Unaccom.
Casa de Pedra já deu sustos
Pelo menos duas denúncias sobre problemas na estrutura da Casa de Pedra já chegaram ao Ministério Público de Minas Gerais, a última em 2017.
Na época, um parecer do órgão apontou risco de rompimento e determinou uma série de medidas corretivas.
De acordo com o promotor Vinícius Alcântara Galvão, a CSN cumpriu as exigências e as perícias posteriores confirmaram a estabilidade da barragem.
Mesmo assim, Galvão lembra que laudos de estabilidade têm curta duração, já que barragens são estruturas dinâmicas, e a fiscalização precisa ser constante.
"Tivemos oportunidade de fazer duas atuações preventivas. Debelamos dois focos de incêndio. Se não tivessem sido debelados na hora certa, poderiam ter se convertido em dano efetivo, em mortes, desastre. Se essa estrutura viesse a romper, seria um dos maiores acidentes da humanidade", alerta Galvão.
O medo dos moradores
Uma característica atípica na Casa de Pedra, que torna a barragem ainda mais assustadora, é a proximidade de moradias junto à represa.
"A gente mora bem debaixo da barragem. Estou morrendo de medo, não só por mim, mas por todos aqui”, conta a moradora Adilene Resende.
O bairro de Adilene é o Residencial Gualter Monteiro, um local com moradias populares. Algumas casas ficam à cerca de 250 metros de distância da represa. A moradora acredita que em caso de novo acidente ambiental cerca de 5 mil pessoas podem ser atingidas.
CSN prometeu encerrar a operação
Em Congonhas não se fala mais em outra coisa. O fim das operações da CSN é uma questão que a população não abre mão.
No final da semana passada, o prefeito Zelinho disse que se reuniu com diretores da Companhia e ouviu a promessa de que o processo de desativação da barragem será concluído até o fim deste ano.
A estratégia da empresa é passar o processo de produção do minério de ferro para o sistema de rejeito a seco, sem precisar usar a barragem, mas terá que ser feito de forma gradual.
Procurada pela BBC News Brasil, a CSN não quis se pronunciar sobre a veracidade da informação.
Para o prefeito José de Freitas Cordeiro, a barragem jamais poderia ter sido construída naquele local. "Está em cima de um bairro que já havia sido instalado. É uma irresponsabilidade muito grande dos órgãos ambientais terem aprovado essa represa. Só mesmo em países subdesenvolvidos isso pode acontecer", reafirmou Zelinho.
O fim do depósito de rejeitos e o descomissionamento da barragem da CSN, se for confirmado, colocaria um ponto final na questão do aumento do alteamento.
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Olá, deixe seu comentário para Barragem gigante que tem cinco vezes mais chances de rompimento que Brumadinho
Rogerio Nacif
Andréa Santos
Se não vamos levar nada
Dessa vida.lamento pelos que
Morreram, e pelo que ficaram marcado por esse tamanho
Sofrimento. Que levaram até o fim de sua vida.muita dor na
Alma.
Guilherme Mendes
Andréa, tem ser humano que parace insaciável, quanto mais tem, mais quer. E quer sem limites, com o sacrifício de milhares de pessoas. É claro que a Vale tem uma importância grande ao empregar milhares de pessoas, ajuda a sustentar inúmeras famílias que dependem dessas atividades. Mas é preciso controle. Abraço.
Claudiomar Batista do Carmo Carmo
Guilherme Mendes
Claudiomar, acho que a cidade está se mobilizando a tempo para evitar uma tragédia. Grande abraço.
Claudiomar Batista do Carmo Carmo
Guilherme Mendes
Claudiomar, as barragens são estruturas instáveis. Esse é o grande problema. E olha que nosso país não sofre com abalos sísmicos. Mas vamos acreditar que tenha sido o último desastre. Abraço.
Márcio Costa
Guilherme Mendes
A impunidade é uma lástima nesse país. Quanto pai de familia, trabalhadoras, jovens... tentaram escapar em fugas suicídas. E o que aconteceu uma semana depois com os responsáveis? Abraço.
Vitor Macêdo
Guilherme Mendes
Vítor, é exatamente isso. Se ela tem uma capacidade cinco vezes maior do que a de Brumadinho, o risco dela é condizente. A barragem de Córrego do Feijão não foi capaz de suportar uma carga cinco vezes menor. A diferença maior entre elas está na técnica de engenharia. Mas se você puder assistir a matéria exibida ontem no Fantástico vai entender um pouco melhor. Obrigado pela visita ao blog. Grande abraço.
Gleison Arlindo
Guilherme Mendes
Gleison, o poder economico está à frente de muita cooisa nesse país. Abraço.
Valdir Guimaraes
Guilherme Mendes
Valdir, tempos que esperar, mas também exigir justiça. O episódio de Brumadinho não pode ser esquecido assim que surgir um outra fato relevante na imprensa. No Brasil vivemos assim, esperando uma outra grande explosão para mudar o nosso foco. Grande abraço.
José Tavares
Guilherme Mendes
Tavares, é uma questão social muito complexa. A grande maioria dessas pessoas não tem para onde ir. Elas nasceram ou foram criadas ali, construíram suas casas e não possuem recursos para ficar se mudando e recomecar a vida do zero de outro lugar. É um problema social muito sério. Abraço.
marcos 546
Não vai dar nada não, para eles, né? a população que se lasque como sempre .
Guilherme Mendes
Marcos, é um absurdo a inércia desse país para algumas coisas. Em compensação, a Vale tá que despeja verba de publicidade nos canais de imprensa. Abraço.
José Tavares
Guilherme Mendes
Tavares, a justiça brasileira não tem a mesma velocidade para tratar de todos os assuntos e com o mesmo interesses. É capaz de soltar sentenças às 5 horas da manhã com medida de urgência, ao mesmo tempo em que consegue passar mais de três anos sem resolver a vida dos infelizes de Mariana. Abraço.